O retorno às aulas presenciais é um assunto envolto em polêmica. Por um lado, há a preocupação com a saúde dos estudantes e o risco de contágio, e por outro, com a descontinuidade dos estudos por um período tão longo. Em São Pedro, os alunos, assim como em todo o país, tiveram as aulas interrompidas em março.
“Mesmo não havendo uma data certa, é urgente planejar como se dará o retorno gradual das atividades escolares no pós-pandemia, com tudo que isso envolve: acolhida dos professores e alunos, protocolos de saúde e higiene, avaliação diagnóstica dos alunos, reorganização do calendário escolar, reposição de conteúdos pedagógicos e atividades de recuperação para mitigar os prejuízos à aprendizagem e evitar a perda do ano letivo de 2020”, observou Alessandra Gotti, fundadora e presidente-executiva do Instituto Articule,consultora da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) e do Conselho Nacional de Educação, no artigo “Como será o retorno às escolas após a pandemia de Covid-19”.
O prefeito Helinho Zanatta também falou sobre a situação. “Em algum momento, as aulas presenciais vão voltar. Precisamos estar preparados para esta nova realidade. Não vamos atropelar nenhum protocolo. Alunos, professores, funcionários, ninguém vai correr riscos, mas é preciso planejar ações de fato para esta nova realidade”, avisa.
Essa “lição de casa” já está em execução pela Secretaria Municipal de Educação de São Pedro. A titular da pasta, Cléia Rivero destaca que estão em desenvolvimento ações como capacitação de diretores, coordenadores, serviços gerais, equipe da Cozinha Piloto, agentes cuidadores, secretários das escolas, equipe de inclusão e motoristas do transporte escolar.
Os professores terão sua capacitação a respeito dos protocolos, ao aproximar-se o retorno as aulas presenciais, uma vez que diariamente estão envolvidos com a produção, envio, acompanhamento das atividades referentes aos elementos de aprendizagem que são encaminhadas aos alunos quinzenalmente, bem como com as orientações aos pais e responsáveis.
As capacitações têm três eixos principais: o protocolo sanitário; educacional e pedagógico e o de acolhimento. “Toda a estrutura está sendo preparada para fazer o acolhimento de pais, alunos, professores e funcionários, que irão receber atendimento diferenciado para tratar da melhor forma os reflexos desta situação que é inédita para todos nós”, afirmou a secretária. A equipe que está fazendo este trabalho é formada por psicólogo, psicopedagogo e assistente social.
Outra ação diferenciada já implantada é a assistência aos alunos de inclusão, hoje realizada pelas psicopedagogas do AEE (Atendimento Educacional Especializado) e a equipe do NAI (Psicólogas e Fonoaudióloga). Estas equipes trabalham remotamente com os pais, orientando as atividades a serem desenvolvidas.
“Escola vai até a família” leva professores às casas dos alunos
A Secretaria Municipal de Educação prepara para setembro o programa “A Escola vai até a família”, criado a partir da identificação de alunos desmotivados ou com um baixo rendimento percebido nas atividades desenvolvidas pelos alunos e encaminhadas aos professores.
A proposta é que os professores responsáveis pelo reforço escolar oferecido na rede municipal de ensino visitem os alunos com atividades específicas para as defasagens apresentadas. Além de receberem orientações do ponto de vista pedagógico, as famílias também poderão ser orientadas em caso de necessidades específicas.
“A estrutura deste programa está sendo organizada no aspecto pedagógico pelos coordenadores; na logística de locomoção pela diretora do transporte escolar e a capacitação dos professores estagiários responsáveis pelo reforço, no preparo para operacionalizar este programa, fica a cargo dos responsáveis pelo Protocolo de Acolhimento (psicóloga e equipe da Secretaria), com apoio da Saúde na orientação sobre o protocolo sanitário e o uso de EPIs (Equipamentos de Proteção Individual)”, conta a secretária Cléia.
Estudo aponta efeitos graves a médio e longo prazo de períodos sem aula
Não há data certa para o retorno das aulas presenciais em São Pedro. Esta definição depende de vários fatores, como as orientações do Estado e condições específicas do município em relação à pandemia.
“Uma boa aula presencial com um bom professor é insubstituível, e assim deve continuar a ser”, destaca o estudo “A Educação não pode esperar”, desenvolvido pelo Comitê Técnico da Educação do Instituto Rui Barbosa (CTE-IRB), Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede) e 26 Tribunais de Contas. A iniciativa faz um mapeamento das ações das redes públicas de ensino do país durante a pandemia e o planejamento que estão fazendo para o retorno às aulas presenciais. O estudo completo pode ser consultado em https://www.portaliede.com.br/wp-content/uploads/2020/06/Estudo_A_Educa%C3%A7%C3%A3o_N%C3%A3o_Pode_Esperar.pdf
O estudo contempla aspectos como oferta de conteúdos pedagógicos de forma remota, suporte e formação de professores, distribuição de alimentos aos estudantes e orientação às famílias. Além disso, mostra como as redes estão se preparando para o retorno em relação às estratégias para combater o abandono escolar, diminuir as defasagens de aprendizagem e garantir a segurança de funcionários e estudantes, diminuindo o risco de contágio pelo novo coronavírus. Há ainda uma análise das práticas adotadas, mostrando alguns caminhos possíveis de serem seguidos por outros gestores.
A amostra que compõe “A Educação não pode esperar” é formada por 249 redes de ensino, de todas as regiões do País, sendo 232 municipais e 17 estaduais. Foram analisadas as capitais e municípios sorteados – metade entre os que possuem maior número de matrículas e metade entre aqueles que atendem alunos de nível socioeconômico mais baixo. Somente na Educação Básica (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio), a suspensão das aulas presenciais envolve 47,9 milhões de alunos.
No item Planejamento para volta às aulas, o estudo indica que 84% das redes municipais declararam que estão se preparando para a volta às aulas. “A falta de definição em relação ao retorno às aulas presenciais no País gera inseguranças e incertezas, mas algo já é sabido: todas as redes de ensino enfrentarão desafios grandiosos no retorno e a construção das melhores soluções passa, necessariamente, pelo envolvimento de todos os atores escolares”, aponta o estudo.
Os responsáveis pelo estudo identificaram entre os que estão mais avançadas no processo de planejamento uma organização em três frentes principais: ações para o acolhimento de professores e alunos e demais funcionários da escola; avaliações diagnósticas para identificar os diferentes níveis de aprendizagem dos estudantes e as principais lacunas de conhecimento e, a partir disso, estabelecer intervenções; e repensar todas as medidas de higiene adotadas nas unidades de ensino, visando a mitigar os riscos de contágio pelo novo coronavírus.
Alerta
O estudo destaca que “para além da incontestável necessidade de isolamento físico neste período, os profissionais da Educação, em específico, e a sociedade como um todo devem estar cientes dos efeitos gravosos a médio e a longo prazo que um período extenso sem aulas pode ter sobre a aprendizagem dos estudantes”.
Para exemplificar as possíveis conseqüências do isolamento, é citado o estudo de Wills, de 2014, que investigou como greves de professores afetaram o desempenho dos alunos no Ensino Fundamental na África do Sul. Os resultados apontaram que, apesar de a duração média da greve nas escolas estudadas representar apenas 7% dos dias oficiais do ano letivo, o efeito sobre a aprendizagem dos estudantes foi equivalente a um quarto de ano perdido. Para os responsáveis pelo estudo, estes dados sugerem que “as paralisações podem gerar efeitos disruptivos na aprendizagem”.
Para estimar os efeitos da suspensão temporária das aulas presenciais no Brasil, o estudo considerou projeções que indicam que, em média, os estudantes devem agregar 13 pontos por ano na escala do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb). Caso sejam transpostos para o cenário nacional, os mesmos efeitos observados no estudo de Wills (impacto na aprendizagem de -0.1 desvio padrão, em média), estes representariam aproximadamente 5 pontos a menos na escala Saeb. Isto é, aproximadamente 40% de toda aprendizagem prevista para um ano letivo.
“Isso considerando como base os estudantes sem aulas por 7% dos dias do ano letivo, o que, no Brasil, equivale a 14 dias”, dado superado há bastante tempo por conta da interrupção das aulas em razão do combate ao novo coronavírus.